Movimento da gravura no Pará

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

João Carlos Torres (Jocatos)




 


“(...)
Mãos carregam caixas
Calos ardem
E os prendem guindastes
E os predem músculos e salário
Homens sob caixas
Ombros sob caixas
Sonhos sob caixas
Seres sob o peso
do trabalho sem quimeras:
Caixas sob caixas.”

Fragmento do poema Cais do porto,
de João de Jesus Paes Loureiro
Altar em chamas, 1983

João Carlos Torres, ou simplesmente Jocatos, é um artista que dispensa maiores apresentações para nós que vivemos e amamos as artes na Amazônia. Sua seriedade e compromisso com a visualidade da região atravessam décadas de trabalho árduo e inventivo. De espírito inquieto, pontua sua produção nas mais variadas possibilidades de expressão, indo da pintura ao site specific com muita desenvoltura e perspicácia. Mais particularmente, seu nome confunde-se com a história da gravura no Pará e no Brasil.
Muito atento aos desdobramentos e exigências da arte hoje, procura ao seu modo, traduzir os caminhos da contemporaneidade numa obra personalíssima e de grande validade para compreendermos o que somos.  Suas mãos calejadas já carregaram muitas caixas e latas. Estas, mesmo que abandonadas, já inutilizadas pelo desuso, são resgatadas pela memória e pela capacidade de resiginificação das coisas.  Através do olhar sensível de Jocatos deparamo-nos com este universo complexo, prenhe de significados. É barroco, é violentamente delicado, é o refluxo da erudição plástica aportando no bairro populoso e vibrante do Guamá: é a resposta possível, impossível de ser ignorada.
Nesta exposição, as caixas e latas que carregou o transportam para outras paragens, outras paisagens. Roda mundo, roda peão. O peão brincante que gira-girando na mão espalmada de menino vira-virando prumo de mestre-de-obras na mão firme do homem-artista. A ponta metálica do peão-prumo risca a lata, marca o papel, marca a vida e a passagem do tempo. O espaço transmuta-se em obra. O Canadá está aqui, o Guamá está aqui. O menino está aqui, o homem-artista está aqui. O que viveu em Quebec, Nova York e Lisboa apruma-se aos vestígios de seu eterno palacete guamaense.
Andarilho de dedos de aço vai tracejando seus encontros e desencontros. Uma linha, uma mancha, uma transparência, uma sobreposição. Um dia, uma noite. Noites brancas. Sol e abandono. Clareiras da alma. Carrega o buril no olhar, mapas e territórios recém-descobertos: explorador de filigranas. Cartografias em silêncio apontam para rumos não identificados. Sabemos de onde vem, jamais o fim desta jornada.

Armando Queiroz
Curador e artista visual

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